Assombros
- Kaos Imaginário
- 25 de jun.
- 3 min de leitura
Atualizado: 28 de jun.

Este espetáculo, intitulado Assombros, é uma recriação da obra Sobressaltos de Samuel Beckett, adaptada por Edward Fão. A peça tem como personagens um Homem e um Vira Lata de pelúcia.
A história se passa no final do dia, começo da noite, em uma praça de uma cidade qualquer. Um homem em situação de rua está montando uma tenda improvisada com papelão e plástico, utilizando uma trouxa de pertences e uma bandeira esfarrapada para cobrir seus objetos. Ele está acompanhado por seu cão.
O homem acende uma pequena fogueira feita com uma lata de cerveja e uma velha lanterna pendurada na barraca. Enquanto prepara sua refeição, ele começa a contar uma história para si mesmo sobre uma luz que vinha das frestas de uma janela, que ele observava para ver o céu. Essa luz era a única possível quando a sua própria luz se apagou, até que ela também se foi, deixando-o na escuridão.
Em outro momento, o homem procura algo dentro de sua barraca e retorna com um radinho de pilha e uma garrafinha de COROTE. Ele liga o rádio e sintoniza em uma estação AM evangélica. Ele continua sua narrativa, descrevendo como ele se via levantando e indo, desaparecendo e reaparecendo em outros lugares, ou no mesmo lugar.
O homem tira pontas de cigarro amassadas do bolso, acende um cigarro e bebe seu COROTE. Ele reflete sobre o passado, lembrando-se de como sempre usava o mesmo sapato e jeans surrado, andando pelas ruas de praças abandonadas. Ele se sente em um lugar estranho, buscando uma saída da escuridão. Ao longe, ele ouve um relógio batendo as horas e meias horas, e gritos, ora fracos ora nítidos. Ele pensa sobre a morte de alguém que o deixou, e como os sons o acompanham em sua esperança e receio.
Em um dado momento, ele levanta a cabeça para ver suas mãos, que descansam após tudo o que fizeram, e depois a deita novamente para que ela também repouse. Ele relembra as ruas onde ia e voltava, marcando passo de parede a parede na escuridão. Agora, ele percebe que nada indica que o lugar onde está não seja outro, um lugar onde ele nunca chegou. As badaladas e os gritos parecem infinitos, talvez nunca mais sejam ouvidos, levando-o a pensar no fim.
Entre um gole e um trago, o homem mexe em sua mochila e retira um livro de recortes com fotos e colagens de recordações passadas. Ele expressa a ideia de paciência até o fim do tempo, do pesar e do eu. Ele reflete sobre sua razão e a dificuldade de descrever o que fez, sentindo-se como um ser dotado de razão emergindo para o mundo exterior, que mal conhecia. As badaladas do relógio que antes eram um conforto, tornaram-se uma aflição, e o som dos gritos aviva sua solidão. Ele tentou se acalmar com a ideia de falta de memória, mas não encontrou sossego. O som de passos silenciosos, como os seus descalços, aumenta seu desalinho. Ele se encontra em um campo de ervas, o que ajuda a explicar seus passos, mas não consegue recordar de nenhum campo de ervas, o que agrava sua aflição.
Finalmente, ele começa a guardar suas coisas na mochila. Na rádio, um programa evangélico executa uma oração. Ele se entrega à observação e meditação, embora se canse rapidamente de revirar lembranças. Ele continua sem saber onde está, como chegou ou para onde vai, resignado e sem vontade de saber, apenas desejando que as badaladas e os gritos parassem para sempre.
No sexto momento, ele retira um cobertor de campanha da mochila, apaga a fogueira e acende uma lanterna, preparando-se para dormir. Na rádio, um programa apresenta um discurso do chefe da nação. Uma palavra do fundo de si mesmo chega aos seus ouvidos. Ele questiona sua presença ali e a possibilidade de sair novamente, sem perigo ou esperança. A confusão em sua mente diminui até não restar mais nada, apenas o chamado que chega e tudo acaba. Ele apaga a lanterna, desliga o rádio e vai se deitar, encerrando a peça.



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